Queria ser laranja
Estou destruída. O futuro, as minhas amizades, até mesmo minha família está a esmagar-me. Sou uma laranja madura que é expremida vezes e vezes sem conta por mãos diferentes umas das outras. Não há problema, ainda resta sumo dentro de mim, o único problema que existe é aquele que já se foi, o sumo que engoliram sem pensarem bem antes o porquê de o beberem. Eu só queria um mundo simples, ter funções de fruta que nunca é tocada, passar de flor a fruta, amadurecer, viver a minha melhor forma com sol ou chuva a cair sob mim, apodrecer e cair pacificamente no solo, quem sabe dar origem a novas frutas como eu mas o mundo é complicado e não há exceções, nem para mim. Sinto as laranjas ao meu redor afastarem-se de mim, fogem para o canto mais bonito da árvore que nos deu vida e é com cada vez menos frequência que regressam para o meu lado. As minhas obrigações familiares forçam-me a amadurecer mais cedo, não dá tempo para sentir o sol ou a chuva tentarem penetrar a minha casca mas não faz mal, nunca faz mal, eu percebo que são só circunstâncias da vida mas não deixa de doer menos. O futuro só existe mas provoca-me medo e esperança, pode tanto trazer o meu apodrecimento ou um maior aproveitamento da vida. No fundo o que eu preciso para me sentir melhor é ser eu mesma a expremer um bocadinho do meu sumo, deixar sair com ele a tormenta para ser uma fruta mais feliz, uma laranja que vive, que sente o sol e a chuva, que vê a beleza no ser e atrai o que lhe falta: confiança em si mesma, menos dependência dos outros e menos dependência dos outros nela.